
O primeiro contato que tive com o pensamento de Edgar Morin foi em um curso de formação de educadores corporativos em 2001. No final do evento ganhei o livro Os sete saberes necessários à educação do futuro. Devorei o livro e comecei a utilizá-lo nas práticas de formação de alfabetizadores de adultos. As ideias do autor contidas no livro eram consonantes, achava eu, com o processo de formação de educadores que iriam trabalhar com alfabetização de adultos e em empresas também.
Anos mais tarde, em outro encontro de formação de educadores corporativos, tive a surpresa de constatar que daquele momento em diante, a ideia de complexidade defendida por Edgar Morin iria ser o alicerce para a formação de novos educadores no âmbito de empresas de forma mais abrangente.
Lembro que exerci um papel crítico sobre a situação, pois achava pertinente a aproximação com o pensamento de Morin na educação em empresas, mas ao mesmo tempo me preocupava o uso quase exclusivo dos referenciais do pensador francês na organização filosófica do curso de formação, que estava em processo de adaptação. Este foi um movimento de reaprendizagem do papel de Edgar Morin para os estudos das humanidades. Era necessário aquele estranhamento para que eu pudesse adentrar no jeito de fazer filosofia de Morin. A crítica que formulei era sobre o porquê de estudiosos brasileiros em educação de adultos não fazerem parte da matriz curricular do curso ou ficarem em posição marginal nas discussões sobre educação de adultos.
Neste intervalo de tempo já são 20 anos de trabalho em educação sob o intricado movimento de aprendizagem com Edgar Morin e acho que a crítica que fiz no curso de formação foi vital para meu amadurecimento como educador de jovens e adultos.
Em 2021 Edgar Morin completa 100 anos de vida. Vi diversos movimentos de referência ao trabalho do filósofo francês. A cada publicação, eu tinha vontade de voltar a algum texto do autor e repensar a educação. Foi neste movimento de saudosismo que vi na sala o livro A cabeça bem-feita – repensar a reforma – repensar o pensamento sobre em uma pequena estante da sala.
A cabeça bem-feita é um livro-síntese sobre educação e vida, com pequenos ensaios muito bem interligados quanto à ideia de aprendizagem para as relações e para a convivência. A compreensão de mundo de Edgar Morin é atravessada por atos humanos que viajam entre o local e o global, entre o contexto e a teoria, no todo e nas partes em movimentos incessantes para a compreensão da educação como ato primordial da vida. A educação assim, se converte em movimento que vai ao encontro da incerteza, que se conjuga em processos que vão além das circunstâncias das disciplinas e vai em direção às dinâmicas inter, da poli e da multidisciplinaridade.
A cabeça pensante (ou a cabeça bem-feita, conforme denominação de Morin) é a construção de uma caminhada rumo à cidadania planetária: eu sou da comunidade e eu sou do mundo. A cabeça pensante é um exercício de cidadania, um educar-se nas contradições, na incerteza e na incompletude, é uma construção permanente de humanidade.
Existe nisto uma vivência que não tem preço: um contínuo diálogo que é necessário para a gente aprender, e aprender com Edgar Morin também é um convite para a gente duvidar e aprender a crescer, criticar, enfim se desenvolver em um eterno reflorescimento.
E foi assim que vivi alguns bons momentos de releitura de A cabeça bem-feita rumo a novos estranhamentos e novas aprendizagens.
Até a próxima!
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