Quando os livros esperam por você

Livros esquecidos
Livros esquecidos

Os livros têm vida própria. Eles ficam escondidos nas estantes nos espreitando. Alguns deles são teimosos e esperam por nós para serem lidos durante toda a vida se for preciso.

Esses livros que esperam a vida toda são aqueles desprezados por nós. Os que ficam dentro de caixas escuras e baús antigos, ou até mesmo estão disponíveis na parte principal da estante, mas parecem a nós como transparentes, imperceptíveis. 

Por isso tudo devemos de vez em quando dedicar um tempo a procurar esses objetos mal amados e incompreendidos por nós. É bom lembrar que a tarefa de procurar objetos que a gente despreza é algo terrível, maçante e tedioso.

Às vezes não lemos esses livros por falta de experiência de leitura ou má formação intelectual, o que nos leva a um afastamento sistemático desses objetos.

Foram com base em motivos como os listados acima que adquiri livros e passei anos sem lê-los, até décadas. 

Nos próximos parágrafos vou trazer alguns relatos sobre livros que eram essenciais para minha leitura e formação, mas que ficaram abandonados nas estantes, esperando o milagre do meu olhar.

Livros abandonados

A escrita, há futuro para a escrita?, de Vilém Flusser – este livro traz uma reflexão sobre a capacidade humana de construção simbólica, um olhar diferenciado sobre uma das maiores invenções da humanidade, a escrita. Meu pecado na hora de lê-lo foi restringir a compreensão inicial do texto a uma análise somente restrita à escrita, quando o texto avança sobre a construção simbólica do humano muito além do código escrito.

Cultura e materialismo, de Raymond Williams – Cultura é um conjunto de ensaios sobre a contemporaneidade na perspectiva da crítica cultural materialista. Fiquei limitado na leitura no âmbito exclusivo da literatura e deixei de perceber como o autor fazia uma análise profunda das relações culturais do século XX. 

As teorias da cibercultura, de Francisco Rüdiger – aqui o autor constrói um panorama vigoroso sobre o contexto filosófico em torno da ideia de cibercultura. Começava a ler e parava, em um ciclo interminável. Quando voltei definitivamente ao texto, reli os trechos já antes analisados e parti para uma compreensão mais consistente do que seria esses construtos culturais atravessados por tecnologias da informação e comunicação no ambiente da internet. 

Cultura da interface, de Steven Johnson, é um olhar minucioso sobre as diversas faces a que o humano está exposto ao interagir com os objetos técnicos. O texto demonstra como a construção das interfaces gráficas contribuíram para o que existe hoje de convivência entre humanos e não humanos e como esse contexto altera a forma como os humanos vivem na atualidade.

Já o livro que mais demorei de ler foi Memórias póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis – um romance-testamento sobre as intrigantes relações culturais construídas no século XIX na sociedade brasileira. Eu tinha medo de conhecer os meandros da sociedade brasileira daquela época, motivo pelo qual, a leitura demorou mais de 14 anos para ser concluída.

Por fim, listo neste grupo Pedagogia da Autonomia, de Paulo Freire, um livro-testamento do educador brasileiro, em que ele busca uma comunicação aberta com a sociedade sobre pressupostos de uma educação como prática da liberdade, sinalizando as gêneses das relações assimétricas de poder no âmbito da educação. Ler Paulo Freire não é fácil, pois ele nos incita o tempo todo a olhar para o que estamos teorizando, assim como nos provoca em torno das práticas que desenvolvemos no dia a dia.

Hoje os livros acima se tornaram referenciais de leitura para mim e ocupam lugares especiais na estante de casa. Digo mais: eles são fontes de releitura e cada vez que os leio, reaprendo alguma coisa para minha formação. 

Caro leitor, fique atento aos livros que estão em casa abandonados. Visite sua estante novamente, abra aquela caixa guardada em um cômodo da casa, pois lá poderá estar adormecido algum tesouro de leitura te esperando.

Até a próxima!


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Publicado por Cleonilton Souza

Educador nas áreas de educação, tecnologias e linguagens.