
Nos anos 1990, o Brasil passou por uma controvertida discussão. De um lado havia as pessoas que defendiam a produção industrial de carros grandes, potentes e velozes, tal quais os carros que eram importados pela classe alta do país; do outro lado, muita gente desejava comprar um carro com preço popular e acessível para as classes menos favorecidas da sociedade.
Foi assim que surgiu o carro popular, de baixa cilindrada, de pouca robustez e de consumo razoável de combustível. Essa geração de carros ajudou a família de baixa renda a se locomover nos momentos de diversão, de trabalho e de necessidade doméstica.
Comprei na época um fusquinha verde. Achava o carro uma beleza e com ele pude fazer viagens com até 400 KM de distância. Rodei durante cinco anos sem problemas no campo e na cidade. Quando eu chegava a algum lugar desconhecido, recordo que as pessoas me abordavam, perguntando se aquele carro não era de Itamar, e eu respondia que não, era meu mesmo, pois naquele período tão repleto de carros populares, o novo fusquinha era chamado de “fusca do Itamar”, presidente da República na época.
O tempo foi passando e chegamos ao século XXI, marcado pelo gosto por carros grandes, quatro por quatro, cabine dupla, motor turbinado, carros feitos para terra de gigantes.
Ao lado desses novos hábitos de consumo que foram se desenvolvendo na vida cotidiana, surgiu a pandemia do coronavírus, junto com agravamento da crise econômico-financeira que já existia e se exacerbou mais ainda no país.
Aí vieram as saídas das empresas automobilísticas do Brasil: diminuir paulatinamente a produção de carros populares, até quase não haver mais produção de carros mais baratos para a população menos afortunada. O interesse do mercado prevaleceu, e a tática da indústria automobilística foi se direcionar para a venda de carros sofisticados, avaliados em mais 100 mil reais. Hoje o carro mais barato não sai por menos de 65 mil reais, o equivalente a 54 salários mínimos. O mundo de hoje é o dos carros de cabines duplas, ocupados geralmente por uma pessoa durante as viagens.
Enquanto isso, os condomínios residenciais e os shoppings center se estruturam com estacionamentos cada vez mais apertados, dificultando a vida dos donos dos gigantes carros que passeiam pela cidade. Nos bairros populares há um amontoado de carros antigos, que ocupam ruas e vielas cada vez mais estreitas: ficamos sem saída.
Diante dessa situação, como vão trabalhar os pequenos empresários, que precisam ter acesso a esses carros populares? E como ficarão as famílias das classes mais pobres que perderão acesso a carros mais populares no futuro próximo? São desafios macroestruturais que se apresentam para as nações no início do terceiro milênio.
Até a próxima!
Licença Creative Commons
Leia+
Descubra mais sobre Canal EPraxe
Assine para receber nossas notícias mais recentes por e-mail.
