
Algumas vezes o capitalismo parece algo distante, difícil de ser compreendido, um tema circunscrito aos círculos de discussões dos sociólogos e economistas, bem distante da vida cotidiana, mas essa forma de relação sociocultural atravessa nosso dia a dia e, de tanto acostumados com a situação, esquecemos de denominar determinados episódios de situações capitalistas e de conhecer melhor essa forma de produzir cultura que tanto afeta nossas vidas.
Vamos acompanhar algumas histórias, com nomes fictícios para os envolvidos, que revelam formas de ordenamento da sociedade, que muitas vezes a gente nem sempre reconhece como de cunho capitalista?
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Primeiro Ato
Conheci Alcebíades, um funcionário público que tinha cargo de gerência em uma grande empresa e trocava de carro todo ano. A vaidade do rapaz era tão grande que ele conseguia que a placa do carro fosse sempre a número um da cidade.
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Segundo Ato
Dona Adélia era comerciante reconhecida na comunidade. Com o negócio, ela conseguiu formar um dos grandes patrimônios da região. Ela se esforçava muito para manter o patrimônio construído, o que, vez por outra, a deixava distante da realidade pobre do lugar. No final do dia, quando ia fechar o estabelecimento comercial, muita gente pobre da cidade costumava mexer no lixo do mercado para apanhar resto de comida. Irritada com aquilo, a comerciante passou a perseguir os próprios funcionários, para que eles impedissem que os necessitados colhessem o que sobrara e naquele momento era descartado. Como iria aumentar as vendas com aquela situação? Pensava ela. Foi então que a comerciante teve a ideia de pôr água misturada com querosene, detergente e vinagre sobre o que sobrava. A comida ficou sem condições de consumo, e toda aquela gente, no final da tarde, saiu em procissão atrás de um outro lugar à procura de comida que pudesse ser consumida.
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Terceiro Ato
Estávamos no mês de janeiro, e o sol nos convidava para ir à praia passar o dia inteiro na beira-mar. Em meio àquele clima gostoso, fomos até uma barraca comprar coco verde. Quando o dono do negócio nos passava o troco, aparecerem cinco homens sem camisa na barraca e deram um ultimato ao vendedor: daquele momento em diante o coco não poderia ser vendido pelo preço estipulado pelo barraqueiro. Havia necessidade de aumento de preço do produto, e se o barraqueiro não se alinhasse aos novos valores, seria expulso do lugar. Olhei para aqueles homens. Na face, havia muita raiva e rancor em relação ao barraqueiro. Interessante era que eles não olhavam para os clientes em momento algum. Os olhos daqueles homens estavam fixados para o novo concorrente que ali instalara.
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Quarto Ato
Já era carnaval tarde da noite, cansado de pular igual a pipoca nas ruas de Salvador, procurei um lugar aconchegante para ficar. Percebi que havia um rapaz baixinho do meu lado com um carro de mão cheio de latas de cerveja, água e refrigerante. Ele estava muito animado e começou a falar sobre coisas da vida que ele levava em Salvador. Sensível à situação do vendedor ambulante, resolvi pedir um refrigerante e depois de alguns minutos, devido ao calor excessivo provocado por aquela multidão, comprei também água mineral.
Após alguns minutos mais de conversa, ele confessou para mim que na verdade comandava cinco vendedores que circulavam na avenida com uma caixa na cabeça cada um deles, vendendo bebidas diversas para os foliões e que ele exercia um controle para que eles produzissem o máximo que pudessem durante os dias de momo. Depois do carnaval? Ora, eles iriam trabalhar em tudo que fosse festa. Fui para casa pensativo naquele dia, pasmado pelo que tinha experienciado a respeito das relações capitais, que invadem quase tudo que realizamos na vida cotidiana.
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Note o leitor que as histórias trazem alguns hábitos que formam a cultura do capitalismo, como cultivo ao consumo, valorização excessiva dos atos de concorrência, práticas de exploração destrutiva da natureza e descentralizada do humano no processo de convivência aqui na Terra, ou seja, a ordem do capital prima por valorizar a primazia de alguns cidadãos e marginalização do restante da humanidade e é preciso refletir sobre isto.
O interessante é que o capitalismo se sustenta por um processo de comunicação via criação do pensamento único, de que só existe uma saída de relacionamento cultural para construção da sociedade, que é o próprio capitalismo. Outro ponto interessante é o que se refere ao destino dos seres que povoam o planeta, com a ideia de que as coisas são assim e que precisam continuar assim: a ideia do “inevitabilismo”.
As pessoas estão comendo frutas sem sementes, pois agora o cidadão comum não pode mais plantar. Quer mais? A destruição desenfreada da natureza virou fato comum, e a gente nem reclama mais; todo dia mudam os pesos dos produtos, em embalagens cada vez menores, enquanto os preços das mercadorias só aumentam; não há lugar mais para estacionar carros nos centros das cidades, pois os espaços públicos agora são alugados.
Quando criança costumava enganar outras crianças, dizendo a elas que havia uma catraca nas entradas das praias, cobrando das pessoas pela utilização do lugar. Incrível como aquela brincadeira está se tornando realidade!
Que podemos fazer diante de tudo isto?
Até a próxima!
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