Lazzo Matumbi – o artista da multiplicidade

Lazzo Matumbi - o artista da multiplicidade
Lazzo Matumbi – o artista da multiplicidade

Não tive a oportunidade de ver Lazzo Matumbi arrastar o Ilê Aiyê no final dos anos 1970, uma pena. Conhecia Lazzo por meio dos comentários que eu ouvia aqui e ali. Foi com a música Do jeito que seu nego gosta, que iniciei a jornada de aprendizagem sobre a concepção musical do artista soteropolitano, um cantor de música afro-brasileira que intersecciona samba de roda, samba duro, samba-canção, afoxé, reggae, samba-reggae e por aí vai…

O grande ápice do meu encontro com a musicalidade de Lazzo foi em um dia de carnaval na Bahia. Lazzo desfilava na Avenida Sete, em Salvador, cantando samba-afro, reggae e samba de roda. Já contei esta história antes: eu estava na praça São Bento, junto da igreja de mesmo nome, quando o trio elétrico com Lazzo surgiu. Os foliões estavam quase parados, pois já havia passado da meia noite e aquela gente parecia muito exausta de tanto dançar prazerosamente.

De repente, um rapaz franzino, saiu correndo para o canto da avenida, pegou duas folhas enormes de coqueiro, adereço muito usado para enfeitar os carros alegóricos na época, e iniciou um balé afro muito bem sincronizado.

As pessoas atônitas já pensavam em correr, pensando que um tumulto iria iniciar, foi quando o dançarino abriu uma roda e começou a fazer movimentos refinados tal qual os pássaros fazem quando começam a voar. Os foliões não sabiam se dançavam reggae, samba de roda ou samba-afro, tal era a facilidade com que Lazzo desfilava de um ritmo para outro.

Em frente ao pequeno largo do São Bento, a terra tremeu em regozijo de paz e harmonia. Ali foi uma experiência fundamental para entender o quanto diversa era a música da Bahia na época.

Foi pelo menos uma hora de música e dança atrás do trio elétrico. Lazzo não sabia somente puxar a galera de bloco afro, também sabia puxar a multidão que vai atrás do trio elétrico. Foi a primeira vez que presenciei um cantor negro em cima de um trio, cantando música afro, fazendo as pessoas pensarem, dançarem e cantarem: momento mágico mesmo.

A partir daquele dia passei a ouvir com mais atenção o cantor e hoje quando ouço algum álbum de Lazzo, lembro daquele momento tão peculiar. Isto foi lá na década de 1980, e eu não lembro nem o dia e nem o ano. Só sei que vivi.

Ainda sobre Lazzo, na segunda-feira do dia primeiro de setembro deste ano, a TV Educativa da Bahia (TVE) transmitiu a nova temporada do TVE Entrevista, tendo como entrevistador o jornalista Bob Fernandes e como primeiro entrevistado Lazzo Matumbi.

A entrevista foi um registro de parte da história da Bahia dos anos 1970-2020, com Lazzo falando de forma desinibida sobre música e questões sociais. Lazzo está sempre com sorriso aberto, mas isto não o impede de tocar em fatos da recente história da Bahia e explicitar momentos de construção de desigualdades de toda ordem (social, racial, econômica, educacional etc.), narrativa feita a partir de fatos ocorridos na própria história de vida do artista.

No final da entrevista, Lazzo declama em forma de cantoria e ladainha a letra da música 14 de maio, uma obra de arte que contrapõe o senso comum de que música na Bahia se presta mais a remelexos e rebolados.

Ficamos por aqui e até a próxima!

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Publicado por Cleonilton Souza

Educador nas áreas de educação, tecnologias e linguagens.