(…) a Teoria tem a vantagem de gerar uma notável profusão de textos, que se comentam entre si e que se destina principalmente à comunidade de autoridade própria teoria.
(…) a Teoria termina por ser, mesmo quando a critica, uma resposta eficiente à demanda produtivista, pois sua forma preferencial de difusão é o artigo especializado, no qual se fala sobre um objeto a partir do ensaio do autor em alta, de última moda, ou a partir de uma ou outra metáfora que se descubra no objeto ou se recolha de autor reconhecido no campo da Teoria (…).
Paulo Franchetti, em Sobre o ensino de literatura, 72
A seção Pensar faz bem! traz reflexões vinculadas à cultura e ao cotidiano. Uma parte significativa dos textos Pensar faz bem! é fruto das leituras que fazemos para construção dos artigos, crônicas e resenhas aqui publicados. O pensamento da quinzena é de Paulo Franchetti, professor de língua e literatura. Boas reflexões!
Entre dois mundos é uma produção francesa que trata dos contrastes entre a vida acadêmica e a vida cotidiana. A narrativa aborda um tema sensível que deveria ser mais explorado pela sétima arte, pois existe uma cultura de exploração de conhecimento vinda da academia que precisa ser melhor observada.
Em Entre dois mundos, uma renomada escritora visita (ou invade, se o leitor assim preferir) a intimidade das pessoas comuns na busca de retratar as pelejas das condições de trabalho na vida contemporânea.
No filme, a infiltrada passa alguns meses experimentando as mesmas agruras que os trabalhadores do século XXI enfrentam, fazendo anotações, é claro, para a construção do objeto de conhecimento, na forma da publicação de um livro.
Que acontecerá com a pesquisadora durante a estadia nos lugares do trabalho na condição de infiltrada? Ela será descoberta? O resultado da pesquisa trará benefícios para quem? Como ficarão as trabalhadoras e os trabalhadores depois da pesquisa? Quer saber as respostas, leitor? Assista.
Trazendo o filme para a minha vida pessoal, já estive em comunidades de trabalhadores em pesquisa de forma explícita, onde a comunidade sabia do que se tratava o meu trabalho. Apesar de ter visitado a comunidade depois do trabalho em campo, não voltei mais vezes para apresentar com mais detalhes os resultados do que foi pesquisado, e isto me incomodou muito.
Fiz comunicação pública sobre as condições dos trabalhadores, mas isto não conseguiu diminuir minha frustração, e até hoje tenho a sensação de que fui um invasor, um estrangeiro, um coletor de dados, infelizmente, um agente da superestrutura do mundo da pesquisa, que reduz a sociedade, muitas vezes, a simples objeto de observação.
Entre dois mundos mexeu nas minhas entranhas; é uma história para desestabilizar e, quem sabe um dia, possamos reencontrar o mínimo equilíbrio na forma como nós acadêmicos adentramos o mundo da vida cotidiana cheios de boas intenções, mas sem notar as possíveis consequências de nossos atos de pesquisadores.
Até a próxima!
Dados da obra O que é? Entre dois mundos [filme] Qual o título original? Le Quai De Ouistreham Quem dirigiu? Emmanuel Carrère Quem atuou? Juliette Binoche, Léa Carne… Quando foi lançado? 2024 De onde foi? França
O socialismo é uma finalidade sem fim. Você tem que agir todos os dias como se fosse possível chegar no paraíso, mas você não chegará. Mas se não fizer essa luta, você cai no inferno. (…) Chamo de socialismo todas as tendências que dizem que o homem tem que caminhar para a igualdade e ele é o criador de riquezas e não pode ser explorado. (…) O que se pensa que é face humana do capitalismo é o que o socialismo arrancou dele com suor, lágrimas e sangue. (…) O produto artesanal é feito para durar, mas o industrial não, ele tem que ser feito para acabar, essa é a coisa mais diabólica do capitalismo. (…) a verdadeira miragem não é a do lucro infinito, é do bem-estar infinito.
Antonio Candido, em O socialismo é uma doutrina triunfante, entrevista feita por Joana Tavares. Disponível em https://www.brasildefato.com.br/2017/05/12/morre-o-critico-logo-antonio-candido-leia-uma-de-suas-ultimas-entrevistas/
A seção Pensar faz bem! traz reflexões vinculadas à cultura e ao cotidiano. Uma parte significativa dos textos do Pensar faz bem! é fruto das leituras que fazemos para construção dos artigos, crônicas e resenhas aqui publicados. O pensamento da quinzena é de Antonio Candido, crítico literário brasileiro. Boas reflexões!
Refazenda (1975), de Gilberto Gil, completa 50 anos de lançado em 2025, e eu preciso viajar em lembranças, para recuperar momentos bem vívidos de minha existência sob a influência dessa obra gilbertiana. Minha mãe olhava pela janela para o infinito, aguardando a chegada do meu pai com algumas compras, para a família usufruir de alguns momentos felizes naquele Natal do final da década de 1970. Já eram 19 horas, quando meu pai chegava em casa, com um saco na cabeça com as compras para a ceia natalina, e o tempo estava bastante curto para preparar a refeição daquele dia singular. Sobre o saco de compras, havia dois discos de vinil, e um deles era uma coletânea de Gilberto Gil, com algumas músicas consideradas clássicos do cantor. Enquanto o pessoal tirava os ingredientes do saco de compras, eu peguei o disco de Gil e pedi permissão ao meu pai para colocar o vinil na radiola da família. Minha interação com a obra de Gil se construiu na adolescência por meio da escuta, anos antes, do disco Refavela, na casa de um tio, uns dois anos antes, e com as escutas nas ondas do rádio. Foi pelos rádios que entre o final da década de 1970 e início da década de 1980, a trilogia Refazenda, Refavela e Realce foram refinando meu gosto musical. O rádio era um meio fundamental na formação das pessoas quando o assunto era música popular brasileira. De Refazenda a memória se abre com Tenho Sede, um jeito simples de falar de amor, que tocava meu coração adolescente à procura de se encontrar com o outro que havia em mim sob formas simbolizadas. Ela foi outra canção que muito me tocou muito, pois ficava extasiado em sentir como um jogo de palavras podia criar tanto significado e mobilizar tantas sensações Com Jeca Total me aproximei das questões políticas, em uma melodia que parecia misturar sons de uma banda marcial com os rudimentos de um misto de reggae e baião. O contato com Retiros Espirituais foi por meio da leitura de um livro da coleção Literatura Comentada, da editora Abril. Gil tinha na expressão musical uma veia espiritual encantadora, que me mobilizava ir ao encontro da transcendência. Há muito de mim em Lamento Sertanejo. Até hoje, mesmo sendo pessoa de cidade grande, ainda tenho necessidade de estar em lugares pequenos, distante do alvoroço das metrópoles. Solidão é algo doloroso, mas necessário. Com Refazenda, música-título do disco, parece que estou assistindo a uma narrativa épica, feita pela natureza, onde os sentidos vão me guiando pelo que há de belo no que não está em mim, mas que permanece comigo. E foi assim que esse disco foi atravessando minha vida, de forma perene, em cinco, dez, 15, 50 anos… Enquanto Refazenda faz 50 anos, vou revivendo e refazendo estes de 50 anos, ressignificando meu existir. Até a próxima!
Dados da obra O que é? Refazenda [LP] De quem é? Gilberto Gil Quando foi lançado? 1975 Quais são as músicas? Ela, Tenho Sede, Refazenda, Pai e Mãe, Jeca Total, Essa é Pra Tocar no Rádio, Ê, Povo, ê, Retiros Espirituais, O Rouxinol, Lamento Sertanejo e Meditação.
A seção Pensar faz bem! traz reflexões vinculadas à cultura e ao cotidiano. Uma parte significativa dos textos Pensar faz bem! é fruto das leituras que fazemos para construção dos artigos, crônicas e resenhas aqui publicados. O pensamento da quinzena é de Chamamanda Adichie, uma homenagem especial aos dias de junho, em que a cultura nordestina resplandece. Boas reflexões!
O canal EPraxe desta semana traz um assunto fundamental para a existência humana: a dialética Saúde-Doença para a construção da nossa existência: viver e morrer. Boa leitura!
Não somos educados para lidar com questões como a doença e a morte e isto nos leva a negligenciar um aspecto importante da nossa existência.
Há pessoas que não vão a hospitais por causa dos doentes que lá se hospedam. Temem adquirir os sintomas geralmente degenerativos nas situações vivenciadas pelos doentes.
Outros não vão a velórios, muito menos vão a cemitérios e deixam de se despedir dos corpos que se separaram dos espíritos de gente querida.
Saúde e doença são duas dimensões interligadas de nossa existência e são elas que fazem a ponte entre a vida e a morte. Desta forma, esses são aspectos que deveríamos nos aproximar sem medos, buscando compreendê-los como parte da jornada existencial.
Afinal de contas, a doença é um aviso sobre nossa vida e pode ser um prenúncio, de acordo com as circunstâncias, para a morte.
Durante muito tempo tive receio de visitar pessoas doentes; tinha crise existencial quando precisava ir a um hospital, mas, aos poucos, fui compreendendo melhor esta dimensão da existência: uma longa jornada de aprendizagem.
Continuo temendo a morte, mas não me furto de ir a velórios e enterros e de me solidarizar com as pessoas que perderam os entes queridos.
O leitor, talvez, fique decepcionado com o tema desta semana do canal EPraxe, mas é necessário discutir sem medos e preconceitos as questões entrelaçadas de morte e vida, doença e saúde, pois são aspectos intrínsecos de nós humanos.